O art. 267 do Código de Trânsito Brasileiro estabelece que, quando um condutor comete uma infração classificada como leve ou média e não possui outra infração nos doze meses anteriores, a penalidade aplicável não é a multa, mas sim a advertência por escrito.
Essa regra, que passou a ter caráter obrigatório após a reforma promovida pela Lei 14.071/2020, representa importante avanço na busca por um sistema de trânsito que priorize a educação em vez da mera punição pecuniária. A seguir, você encontrará um guia completo sobre o tema, com explicações detalhadas, exemplos práticos, orientações sobre defesa e recursos, além de respostas às dúvidas mais frequentes de motoristas e operadores do direito.
O que diz o Art. 267, Capítulo XVI do CTB
Art. 267
Deverá ser imposta a penalidade de advertência por escrito à infração de natureza leve ou média, passível de ser punida com multa, caso o infrator não tenha cometido nenhuma outra infração nos últimos 12 (doze) meses.
(Redação do caput dada pela Lei n. 14.071/20, em vigor a partir de 12ABR21)§ 1º (Revogado pela Lei n. 14.071/20, em vigor a partir de 12ABR21)
§ 2º (Revogado pela Lei n. 14.071/20, em vigor a partir de 12ABR21)
O que diz o dispositivo legal
O atual texto do art. 267 dispõe que deve ser imposta advertência por escrito à infração de natureza leve ou média, passível de multa, caso o infrator não tenha cometido outra infração nos últimos doze meses. O verbo “deverá”, introduzido pela Lei 14.071/2020, retirou a discricionariedade que existia antes da alteração legislativa, tornando a medida vinculada sempre que preenchidos os requisitos legais. Os parágrafos que disciplinavam critérios adicionais foram revogados, de modo que as condições de aplicação ficaram resumidas à gravidade da infração e à ausência de reincidência no período de um ano.
Evolução histórica do dispositivo
Quando o CTB foi promulgado em 1997, o art. 267 previa a possibilidade — não a obrigação — de aplicar advertência por escrito. A ideia era contemplar o princípio educativo do sistema de trânsito, mas, na prática, muitos órgãos preferiam manter a multa, por ser fonte de arrecadação e exigir menos análise individual. A insatisfação social levou a diversas propostas de alteração até que, em 2020, o Congresso aprovou a Lei 14.071, transformando o caráter facultativo em obrigatório. O objetivo foi alinhar o dispositivo a uma visão pedagógica de penalidades, incentivar a boa conduta e reduzir a carga de processos administrativos.
Conceito de advertência por escrito
Advertência por escrito é sanção administrativa de caráter educativo, sem geração de pontos e sem cobrança de valores. Consiste na expedição de documento oficial que adverte o infrator da irregularidade cometida, reforçando a obrigação de observar as normas de trânsito. Diferente da simples anotação no prontuário, a advertência formal é registrada no Renainf, mas não interfere em pontuação. No eventual descumprimento de futuras normas, o histórico de advertência poderá ser considerado para caracterizar reincidência.
Requisitos para aplicação da advertência
Para que a autoridade aplique a advertência por escrito, dois requisitos precisam coexistir:
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A infração deve ser leve ou média.
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O condutor não pode ter cometido nenhuma outra infração nos doze meses que antecedem a data do fato gerador.
Cumpridos esses requisitos, a autoridade de trânsito está vinculada à conversão da multa em advertência. Caso inexistam dados suficientes para confirmação do histórico, a autoridade pode diligenciar junto ao Renainf ou solicitar ao infrator documentação comprobatória. Desatendidos quaisquer dos requisitos, permanece a penalidade de multa e os pontos correspondentes.
Procedimento administrativo
Após o auto de infração, o órgão analisa automaticamente a gravidade e o histórico do condutor. Atendidos os requisitos, o setor competente converte a multa em advertência por escrito e expede notificação específica. A decisão deve ser registrada para fins de controle e arquivada no processo do condutor. Se, por erro, a multa foi gerada e paga, o condutor tem direito à restituição, bastando comprovar que preenchia as condições legais. Caso o órgão deixe de converter, cabe impugnação na defesa prévia ou recurso à Jari, argumentando a obrigatoriedade prevista no art. 267.
Diferenças entre advertência e multa
A multa impõe ônus financeiro e pontuação variável de três a sete pontos, enquanto a advertência não acarreta valor a pagar nem pontos. A advertência também não impede licenciamento ou transferência do veículo, pois nada fica pendente no sistema de débitos. Além disso, a multa passa a constar do prontuário como infração punida pecuniariamente — algo que pode impactar o valor de seguros —, ao passo que a advertência evidencia boa conduta prévia do motorista.
Reflexos nos registros de pontuação
Porque a advertência não agrega pontos, a pontuação do condutor permanece intacta, o que pode ser decisivo para evitar a suspensão do direito de dirigir em caso de pontuação elevada. O registro serve apenas como anotação educativa. Para motoristas profissionais, como taxistas e motoristas de aplicativo, isso também significa evitar prejuízos na análise de perfis por seguradoras e plataformas que costumam verificar pontuação e antecedentes de trânsito.
Direito de defesa do motorista
Mesmo nos casos em que a advertência é devida, o condutor mantém o direito de apresentar defesa prévia, recurso à Jari e recurso ao Cetran. Na prática, as defesas dirigem-se mais a contestar o motivo do auto (por exemplo, erro de fiscalização ou veículo em guincho) do que a discutir a penalidade. Contudo, se a autuação indicar multa quando deveria ter sido advertência, a defesa torna-se um pedido de conversão. O prazo para defesa prévia é de trinta dias a contar da notificação, salvo prazos específicos do órgão.
Possibilidades de recurso
Se a autoridade rejeitar a conversão automática, cabe recurso fundamentado em:
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violação ao art. 267 pela não aplicação de advertência;
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ausência de fundamentação específica para manter a multa;
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desvio de finalidade e violação aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
Decisão improcedente na Jari ainda pode ser levada ao Cetran, onde a jurisprudência administrativa tende a confirmar a obrigatoriedade da advertência. Há julgados que consideram nula a penalidade se as condições do art. 267 estavam presentes e não foram observadas.
Situações práticas e exemplos
Imagine um condutor que, após estacionar em local permitido, deixa o pisca-alerta ligado e é autuado por luz alta indevidamente (infração leve). Se não possui outras infrações há mais de um ano, a penalidade deve ser advertência por escrito. Em outro caso, motorista registrado como profissional de entrega excede em 5 km/h o limite de via urbana (média). Preenchidos os mesmos requisitos, aplica-se a advertência. Quando há múltiplas infrações no mesmo dia, cada auto é analisado individualmente; se pelo menos uma ocorrência impede o cumprimento dos requisitos (como uma grave), as leves ou médias podem continuar aptas à advertência, mas a decisão final depende da autoridade.
Entendimento dos órgãos de trânsito
Os Detrans estaduais têm editado portarias padronizando o procedimento; muitos implantaram sistemas que identificam automaticamente a conversão. Contudo, falhas de comunicação entre bancos de dados podem gerar indeferimentos, exigindo revisão manual. Já a PRF, responsável por rodovias federais, segue orientação normativa própria, mas aplica o art. 267 da mesma forma, inclusive para veículos de outros estados.
Mudanças trazidas pela lei 14071 de 2020
A principal alteração foi a obrigatoriedade de aplicar advertência quando presentes os requisitos, substituindo a redação anterior que dizia “poderá”. Além disso, os parágrafos que atribuíam maior discricionariedade foram revogados. A mudança alinhou o CTB às recomendações de organismos internacionais que privilegiam educação no trânsito, como a ONU em suas Décadas de Ação pela Segurança Viária. Também reduziu litígios, pois a matéria deixou de depender da interpretação de cada agente ou órgão.
Jurisprudência relevante
Diversos tribunais estaduais têm confirmado decisões que anulam multas indevidamente aplicadas. Em São Paulo, o TJSP manteve sentença que determinou a conversão de multa leve em advertência e ordenou devolução do valor pago, considerando violação ao princípio da legalidade. No Paraná, o Cetran pacificou o entendimento de que, uma vez comprovada a inexistência de infrações anteriores, a autoridade não pode se furtar à conversão. Esses precedentes sustentam a tese defensiva em processos administrativos e judiciais.
Impacto para motoristas profissionais
Motoristas de aplicativos, caminhoneiros e outros profissionais dependem da CNH para sua subsistência. A redução de pontos decorrente da advertência pode significar a diferença entre manter o direito de dirigir ou sofrer suspensão. Além disso, a inexistência de multa evita desgastes financeiros frequentes na atividade profissional e mantém o histórico limpo, requisito exigido por várias empresas de logística.
Consequências em contratos de seguro
Companhias seguradoras consideram o histórico de infrações ao calcular prêmios. Pontuações elevadas ou multas recentes implicam risco maior e, por isso, valores mais altos. A advertência, ao não gerar pontuação, ajuda a manter o perfil mais favorável. Ademais, seguradoras podem aplicar bônus de renovação para segurados sem multas no período de vigência.
Relação com programas de educação no trânsito
Alguns Detrans condicionam a manutenção da advertência ao comparecimento do condutor a minicursos presenciais ou virtuais de direção defensiva. Embora não exista previsão expressa no art. 267 para tais condicionantes, a medida busca reforçar o caráter pedagógico. O não comparecimento pode acarretar manutenção do registro sem consequências adicionais, pois a lei não vincula o benefício a posterior participação em curso. Contudo, programas de reeducação, como a “Escola Pública de Trânsito”, estimulam o condutor a aprimorar conhecimentos e evitar reincidência.
Dicas para prevenir reincidência
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Revise periodicamente o calendário de manutenção do veículo; faróis e pneus em bom estado evitam infrações.
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Respeite limites de velocidade, sobretudo em vias com fiscalização eletrônica.
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Planeje rotas para diminuir prazos apertados e reduzir o risco de infrações de estacionamento.
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Faça cursos periódicos de direção defensiva para atualizar-se sobre mudanças legislativas.
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Mantenha atenção redobrada em áreas escolares e residenciais, locais de maior incidência de infrações leves.
Perguntas frequentes
Qual diferença entre infração leve e média?
Infrações leves geram normalmente três pontos, enquanto médias geram quatro. Ambas podem ser convertidas em advertência se o condutor preencher os requisitos do art. 267.
Preciso solicitar a advertência ou ela é automática?
A conversão deve acontecer de ofício pelo órgão. Se não ocorrer, você pode pedir na defesa prévia que a multa seja convertida.
Caso eu já tenha pago a multa, posso reaver o valor?
Sim. Comprove o cumprimento dos requisitos e solicite restituição administrativa ou judicial.
A advertência por escrito consta no meu prontuário?
Sim, mas somente como histórico educativo, sem pontos ou restrição para licenciamento.
A advertência impede a renovação da CNH?
Não. Como não gera débitos nem pontos, não há impedimento.
E se eu receber outra infração leve dentro de um ano?
A nova infração não poderá ser convertida, pois você perderá o requisito de inexistência de reincidência.
Posso recorrer à Justiça se o órgão negar a conversão?
Sim. Além de recurso administrativo, é possível ajuizar mandado de segurança ou ação anulatória para garantir aplicação do art. 267 e devolução do valor pago.
Infrações leves cometidas por ciclistas ou pedestres entram nessa regra?
O art. 267 se aplica apenas a condutores de veículos motorizados, pois está inserido no capítulo de penalidades administrativas ligadas a CNH.
Conclusão
O art. 267 do Código de Trânsito Brasileiro concretiza o caráter educativo do sistema de penalidades ao determinar a advertência por escrito para condutores que cometem infrações leves ou médias sem histórico recente de irregularidades. A mudança legislativa de 2020 transformou a medida em obrigação e fortaleceu princípios de proporcionalidade, razoabilidade e eficácia preventiva. Conhecer essa regra é fundamental para motoristas e advogados, pois pode evitar custos desnecessários, preservar pontos na carteira e incentivar práticas mais seguras no trânsito. Em última análise, a advertência por escrito traduz o compromisso do Estado em educar antes de punir, contribuindo para vias mais seguras e cidadãos mais conscientes.