Qual a sua opinião quanto ao projeto de lei que prevê que qualquer pessoa pode registrar uma infração de trânsito?
Aliás, você sabe o suficiente sobre o tema para formular sua opinião?
Se sua resposta for negativa, este artigo foi feito para você sanar todas as suas dúvidas a respeito do assunto e, finalmente, poder se posicionar.
A ideia de abranger as possibilidades de denúncia sobre os descumprimentos da legislação de trânsito partiu do Senador Fabiano Contarato (Rede/ES), com a criação do PL 601/2019.
Na prática, qualquer pessoa, munida com registros de vídeos, fotos ou outras provas, pode encaminhar a acusação de que alguém que esteja cometendo uma infração de trânsito - atividade que, até então, só pode ser exercida por agentes competentes.
No entanto, essa medida, desde que foi lançada, em fevereiro de 2019, vem dividindo opiniões.
Para você ter uma ideia, o portal Fale com o Senado criou uma enquete questionando os internautas: “você apoia essa proposição?”. Até o momento, foram computados 475 votos a favor e apenas 56 contrários.
Embora a votação ainda esteja aberta, a diferença entre as opiniões já é bastante significativa, não é mesmo?
Ao que tudo indica, muitas pessoas concordam com a implementação da nova proposta.
Como prometi no início do texto, você terá a possibilidade de desenvolver seu parecer sobre esse tema de forma mais embasada ao término na leitura.
Além de ficar por dentro de outras opiniões sobre o PL, você também terá acesso a informações importantes sobre a fiscalização de trânsito (como é feita, quais as ampliações do alcance fiscalizatório, a limitações dos órgãos fiscalizadores etc.).
Portanto, siga acompanhando o artigo e tire todas as suas dúvidas.
Como já mencionei, o Projeto de Lei nº 601, de 2019, foi idealizado pelo senador Fabiano Contarato (REDE/ES). A ementa do projeto altera a Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 – o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), com a finalidade de reconhecer o registro de infrações de trânsito efetuado por qualquer pessoa (física ou jurídica), como forma de prova para a lavratura do auto de infração.
A nova lei alteraria, especificamente, o art. 280 do CTB, que trata sobre como deve ser lavrado o auto de infração.
Tal artigo, atualmente, menciona que as formas de comprovação do cometimento de infração acontecem da seguinte forma:
- a infração precisa ser comprovada por declaração da autoridade ou agente de trânsito, por aparelho eletrônico ou equipamento audiovisual e de reações químicas;
- caso a autuação não seja realizada em flagrante, o agente de trânsito precisará relatar o fato ocorrido à autoridade no próprio auto de infração;
- quanto aos agentes de trânsitos, estes fazem referência a: servidores civis, estatutários ou celetistas ou, ainda, policiais militares.
Como você pode ver, a ação de fiscalização é restrita a um grupo específico de pessoas capacitadas para tal finalidade. Agora, veja o que passaria a vigorar, no art. 280, caso o PL seja aprovado:
"Art. 280
(...)
2° A infração será comprovada:
I - por declaração da autoridade ou do agente da autoridade de trânsito, por aparelho eletrônico ou por equipamento audiovisual, reações químicas ou qualquer outro meio tecnologicamente disponível, previamente regulamentado pelo CONTRAN;
II - por qualquer pessoa, física ou jurídica, que registrar o fato por vídeo, fotografia ou outros meios de prova em direito admitidos, e remeter à autoridade de trânsito, que poderá, assegurado o direito à contraprova, lavrar o respectivo auto de infração.
(...)
5° Na hipótese do inciso ll do § 2° deste artigo, caso fique comprovada a comunicação falsa da infração de trânsito, ficará o agente sujeito às sanções previstas na Lei Penal."
A ideia de que todo cidadão seja autorizado a comprovar o cometimento de infração de trânsito de terceiros é vista como uma forma de reduzir os delitos cometidos e, consequentemente, tornar o trânsito mais seguro, conforme explana o autor do projeto.
Isso porque, para ele, muitos motoristas infratores acabam saindo impunes, utilizando meios escusos para burlar a fiscalização.
Outro ponto que o autor aborda a favor do PL é a limitação do alcance dos aparatos estatais para resolverem, sozinhos, esse tipo de problema.
Ao encontro de todas as justificativas apontadas a favor do projeto, até aqui, o senador conclui que há uma série de descumprimentos da lei que rege o tráfego de veículos que pode ser registrada pelo cidadão comum, tais como estacionamento em vagas reservadas ou proibidas, excesso de velocidade, ultrapassagem de sinal, desrespeito à sinalização das vias, direção que oferece risco para os demais usuários das vias, entre outros.
É importante mencionar que, atualmente, o CTB determina que provas como vídeos ou imagens realizadas por terceiros só podem ser utilizadas em casos em que se queira comprovar que o condutor infrator está dirigindo com capacidade psicomotora alterada (seja por influência do álcool ou de qualquer substância psicoativa), conforme o § 2º do art. 306.
Nesse caso, Contarato defende que a impossibilidade da realização de registros desse tipo, por terceiros, vai de encontro à legislação penal, que admite a utilização de todos os meios legais de provas para a concretização dos fatos.
Para exemplificar, o senador cita um hipotético acidente de carro em que pessoas que presenciaram o ocorrido tenham filmado ou fotografado a cena.
Nessa situação, as provas recolhidas podem servir para a instauração de um inquérito criminal, mas não para a lavratura de um auto de infração de trânsito. Conforme as palavras de Contarato “pode-se o mais, mas não o menos”.
Assim, em equiparação ao que acontece com outros tipos de crime, que não de trânsito, o autor do PL cita o art. 301 do Código de Processo Penal, o qual determina que qualquer pessoa (assim como as autoridades policiais e seus agentes) deve prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.
A fim de embasar a valia do projeto, o senador menciona a experiência obtida pela Justiça Eleitoral nas eleições municipais de 2016 e gerais de 2018, com o aplicativo móvel “Pardal”, que possibilitava aos eleitores o encaminhamento de fraudes eleitorais.
Essa medida tornou a ação do Ministério Público mais efetiva, uma vez que ficou prático identificar e solucionar os problemas detectados, como compra de votos e propaganda eleitoral irregular, por exemplo.
Fabiano Contarato conclui a explicação do Projeto de Lei ressaltando que ele não tem como objetivo transferir a obrigação de fiscalizar o Estado para os cidadãos, mas “ampliar o alcance fiscalizatório e dar efetividade à legislação”.
Vale ressaltar que, uma vez fornecida a prova do delito e, posteriormente, remetida ao órgão competente, há o direito de contraditório e ampla defesa do motorista para, somente após constatada sua veracidade, o poder público poder lavrar o auto de infração.
Atualmente, o Projeto está sendo analisado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). Se aprovado, seguirá ao Plenário.
E você, após a leitura de toda a proposta do PL, o que opina sobre o seu possível funcionamento?
Para ajudá-lo, no próximo tópico, algumas opiniões sobre o tema.
O projeto de lei que prevê que qualquer pessoa possa registrar infração de trânsito gera uma série de discussões nos mais diversos meios.
Enquanto algumas pessoas se mostram favoráveis à ideia, como você pôde conferir na votação do Portal do Senado, exposta anteriormente, outras apresentam ressalvas contra a proposta.
Em primeiro lugar, é preciso que haja o conhecimento da legislação de trânsito para que o indivíduo seja capaz de julgar alguma atitude como certa ou errada. Uma acusação não pode ser feita com base em “achismos”.
O Portal Correio entrevistou o superintendente da Secretaria de Mobilidade Urbana de João Pessoa (Semob), Adalberto Araújo, para saber qual a sua opinião sobre o PL.
Adalberto afirmou que ainda é cedo para um pronunciamento, uma vez que o projeto encontra-se em tramitação, mas fez questão de frisar que é importante atentar para a aplicabilidade da Lei, assim como ter bem definidas as etapas e métodos para que haja garantia de que os órgãos de trânsito poderão cumpri-las.
Da mesma forma, o superintendente da Superintendência de Trânsito e Transportes Públicos de Campina Grande (STTP), Félix Neto, em entrevista ao mesmo site, também apresenta dúvidas acerca do funcionamento do PL.
Para ele, o projeto só terá valia se servir como instrumento de denúncia da população. Ele coloca em cheque, nesse caso, como serão realizadas, de forma prática, essas denúncias.
Nesse sentido, ele pondera que, diferentemente do que acontece nos dias de hoje, em que, após o flagrante realizado pelo agente, há a identificação de horário e local do cometimento da infração, uma foto ou vídeo como provas torna desnecessária a constatação em flagrante.
Félix também problematiza os casos em que os registros por qualquer cidadão poderão ser motivados por problemas pessoais ou, ainda, por meio de montagens.
Outros especialistas asseguram que é preciso imparcialidade para registrar a infração, o que só agentes de trânsito treinados teriam capacidade para realizar.
Em entrevista cedida ao portal Senado Notícia, uma taxista também manifesta opinião contrária à proposta do senador.
Conforme ela, uma pessoa que não conhece a legislação (que é a maioria da população) está despreparada para julgar e aplicar infrações ao próximo.
Como você pode ver, há uma série de questões que precisam ser analisadas com muito cuidado antes de colocar em prática o projeto de lei que prevê que qualquer pessoa possa registrar infração de trânsito.
É importante que seja levado em consideração, nesses debates, questões como a fé pública das provas apresentadas; a possibilidade de perseguição por alguém que possa forjar as situações irregulares e a proteção à imagem dos cidadãos.
No quesito proteção à imagem, vale a ressalva: embora não esteja especificada no PL, quando abordada a forma de comprovação de delito por meio de imagens ou vídeos, é importante ter em mente que a ideia é que esse registro seja realizado apenas do veículo e de sua placa, e não do motorista – uma vez que, do contrário, essa medida entraria em choque com o art. 20 do Código Civil, que disserta sobre o direito de imagem.
Ainda não há, então, especificidades de como deverão ser realizadas as provas, nem a forma de envio destas aos órgãos competentes, visto que o PL, até o momento, encontra-se em fase inicial de discussão.
No entanto, é importante que você tenha uma dimensão sobre o que se propõe e quais as possíveis consequências (positivas e negativas) que ele pode acarretar. E isso já pode ser feito com base no que foi exposto até aqui.
Então, você consegue formular uma opinião sobre o PL 601/2019? Concorda com o projeto ou prefere que as infrações sigam sendo de responsabilidade de órgãos especializados no assunto? Vale a reflexão, não é mesmo?
Por falar nisso, você sabe quem, de fato, hoje, pode aplicar multas? Se ainda tem dúvidas sobre isso, continue a leitura que irei explicar no próximo tópico.
Embora exista um projeto de lei, citado ao longo de todo o artigo, que proponha a possibilidade de denúncia de ilegalidades de trânsito por qualquer cidadão, isso ainda não acontece.
No Brasil não existe apenas um órgão ou entidade responsável pela aplicação de multas. Essa função, de certa forma, é subdividida entre diferentes órgãos conforme o tipo de estrada em que o condutor autuado está trafegando no momento do flagrante.
Para facilitar a explicação, irei mencionar o tipo de via e quem pode realizar o registro de infração.
Acompanhe abaixo.
Como o próprio nome sugere nas rodovias e estradas federais a fiscalização e a aplicação de multas de trânsito deve ser de responsabilidade de órgãos e entidades federais.
Conforme dispõem os artigos 20 e 21 do CTB, é, portanto, função da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT).
O DNIT opera como uma autarquia federal, podendo autuar os condutores infratores e arrecadar o dinheiro das multas.
Outra autarquia conhecida nas autuações das estradas federais é a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
Trata-se de uma autarquia federal que supervisiona, regulamenta e fiscaliza as empresas autônomas de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros, bem como o transporte rodoviário de cargas.
A ANTT, portanto, também pode autuar os tipos de motoristas citados acima.
A responsabilidade de fiscalização das estradas estaduais, também como o nome pressupõe, é do Governo Estadual.
Nesse caso, o órgão responsável por realizar autuações de infrações é a Polícia Rodoviária Estadual (PRE) e o Departamento Estadual de Trânsito (DETRAN) de cada estado, conforme expõe o art. 22 do CTB.
Há uma ressalva, porém, para as estradas estaduais que acabam cruzando por municípios. Nesse caso, as prefeituras é que têm essa função.
Além disso, da mesma forma como o DNIT pode aplicar multas nas estradas federais, outro órgão executivo da união, o Departamento de Estradas de Rodagem (DER) também pode desempenhar esse papel nas estradas estaduais.
Dentro dos municípios a questão da aplicação de multas muda um pouco. Isso porque cada cidade tem a autonomia de determinar qual será o órgão que realizará esse papel.
É comum em muitos municípios que, nesses casos, as prefeituras criem Empresas Públicas de capital estadual para a delegação da responsabilidade de aplicação de multas, como é o caso da Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) em Porto Alegre e a Companhia de Engenharia e Tráfego (CET) em são Paulo.
Até o momento, você viu uma série de órgãos que desempenham, entre outros papéis, a função de aplicar multas de trânsito, mas não pense que acabou por aqui.
Na próxima seção, você verá que ainda existem mais órgãos de trânsito que podem realizar essa missão. Continue a leitura e veja quais são eles.
Como mencionei anteriormente, a papel de autuação de infração irá variar conforme o local em que o condutor foi flagrado cometendo algum delito (rodovias federais, estaduais ou municipais).
Mas ainda existem outros que não foram citados e também têm esse encargo. São eles:
A legitimidade da capacidade de aplicação de multas da Guarda Municipal já foi alvo de muitos debates.
Em 2015, o Supremo Tribunal Federal (STF) tornou válida a aplicação de multas pela Guarda Municipal, conforme trecho do documento de decisão:
“(…) fixação, em repercussão geral, da seguinte tese: é constitucional a atribuição às guardas municipais do exercício de poder de polícia de trânsito, inclusive para imposição de sanções administrativas legalmente previstas.”
Nesse caso, se você for multado por algum responsável deste órgão, saiba que a medida é legal.
Como já mencionado no texto, os municípios têm a possibilidade de delegar a responsabilidade de registro de infrações.
Nesse caso, havendo um convênio entre o município, a Polícia Militar e os agentes municipais, essa função pode, sim, ser desempenhada pelos policiais – veja como exemplo as blitzes da Lei Seca, que também podem ser realizadas por esse órgão.
Agora que você já sabe todos os órgãos capazes de aplicar multas de trânsito, fique atento para o seguinte fato: todas as autoridades mencionadas aqui, ao aplicarem alguma multa, deverão obedecer às determinações do art. 280 do CTB, que trata o seguinte:
“Art. 280. Ocorrendo infração prevista na legislação de trânsito, lavrar-se-á auto de infração, do qual constará:
I – tipificação da infração;
II – local, data e hora do cometimento da infração;
III – caracteres da placa de identificação do veículo, sua marca e espécie, e outros elementos julgados necessários à sua identificação;
IV – o prontuário do condutor, sempre que possível;
V – identificação do órgão ou entidade e da autoridade ou agente autuador ou equipamento que comprovar a infração;
VI – assinatura do infrator, sempre que possível, valendo esta como notificação do cometimento da infração.”
Mas lembre-se: é seu direito recorrer a qualquer tipo de infração recebida. Para isso, você tem três chances de realizar sua defesa: Defesa Prévia, recurso em primeira instância (JARI) e recurso em segunda instância (CONTRAN; CETRAN; CONTRANDIFE).
Então, faça valer o seu direito e recorra sempre que julgar possível.
No artigo que você acabou de ler, eu abordei todas as informações existentes, até o momento, sobre a tramitação do Projeto de Lei que prevê a possibilidade de qualquer pessoa poder registrar infrações de trânsito – o PL 601/2019.
Além de analisar a proposta em si, idealizada pelo Senador Fabiano Contarato (Rede/ES), você também teve acesso a algumas opiniões sobre o tema, tanto de especialistas da área como de usuários comuns das vias terrestres.
Como ele ainda não foi aprovado pelo Poder Legislativo é necessário aguardar as cenas dos próximos capítulos para saber se a população poderá gozar desse poder.
Finalmente, esclareci quais os órgãos que, atualmente, são (os únicos) responsáveis por desempenhar esse papel de fiscalização.
Ressalto, novamente, que, para qualquer multa recebida, você pode – e deve – utilizar seu direito de recorrer.
Referências:
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