Uma fatalidade tem permeado os noticiários desde a noite do dia 18 de janeiro de 2018.
Um carro invadiu a calçada de Copacabana, no Rio de Janeiro (RJ), atingindo algumas pessoas que circulavam pelo local.
No acidente, uma criança de 8 meses acabou morrendo e 17 pessoas ficaram feridas.
Ao ser questionado, o motorista em questão afirmou sofrer de epilepsia, uma doença neurológica que atinge 50 milhões de pessoas no mundo.
No carro, foram encontrados remédios usados para o tratamento da doença, e a esposa do motorista, que estava no veículo na hora do acidente, confirmou que, no momento do atropelamento, o marido sofreu um ataque e desmaiou.
O Departamento de Trânsito (Detran) declarou que Antônio Anaquim, 41 anos, ao fazer os exames para habilitação, não afirmou sofrer da doença, como é solicitado.
Inclusive, ainda segundo o questionário, no espaço reservado para responder se passava por algum tipo de tratamento, Anaquim inicialmente respondeu “sim” à pergunta, mas, após, rasurou, assinalando “não” e apagando os nomes dos remédios escritos.
O delegado responsável pelo caso afirma que as investigações já foram iniciadas. A justiça irá apurar se o motorista tinha ou não consciência desse problema e se, ao dirigir, estava ciente de que poderia causar algum acidente.
De acordo com a polícia, o motorista responderá por homicídio culposo, isto é, quando não houve a intenção de matar.
A Carteira Nacional de Habilitação (CNH) de Anaquim, suspensa desde 2014, foi retida pelas autoridades e, agora, está sendo instaurado um processo de cassação do documento.
Você sabe como acontece o processo de habilitação para quem informar sofrer de algum tipo de doença?
Neste artigo, apresentarei, para você, como a legislação trata esses casos e quais doenças podem comprometer a segurança do condutor na hora de conduzir algum veículo.
A ansiedade faz parte da conquista do documento de habilitação e é muito comum, pois essa decisão também acarreta em diversas responsabilidades, que todo novo motorista recebe como atribuição ao conquistar o direito de dirigir.
Ao obter a CNH, algumas pessoas buscam independência quanto a sua locomoção, pois ter um veículo facilita bastante o nosso dia a dia, ainda mais atualmente, em que vivemos sempre contra o relógio.
Outros estão em busca de um meio para gerar sua renda, ou complementá-la, como é o caso de motoristas de aplicativos de transporte.
Porém, como talvez você deve saber, o processo para obter a CNH requer alguns requisitos.
Para ser habilitado é preciso, inicialmente, ter mais de 18 anos, ser alfabetizado, possuir documento de identificação e comprovante de residência, emitido em até 90 dias.
A partir de então, o motorista é submetido a processos e exames, que são realizados pelo órgão executivo de trânsito.
Conforme o Art. 147 do Código de Trânsito brasileiro (CTB), os primeiros exames a serem realizados serão os de aptidão física e mental.
Os procedimentos desses 2 tipos de exames estão dispostos na Resolução Nº 425 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), que normatizou os direitos e deveres que todo futuro motorista tem ao passar pelo processo de habilitação.
Para contribuir com a segurança do trânsito, toda pessoa que deseja tornar-se uma motorista habilitada passa por um exame psicotécnico.
Os departamentos de trânsito pretendem testar, por meio dessa avaliação, as capacidades psicológicas do futuro condutor ao desenvolver diferentes atividades.
Até mesmo porque, como sabemos, o trânsito requer paciência, pois há situações de estresse, de engarrafamento e, às vezes, somos obrigados a dividir a via com maus motoristas.
Os profissionais que submetem os futuros habilitados ao exame são devidamente preparados para esta função, pois o Contran determinou que o médico perito deve ser psicólogo perito examinador de trânsito.
A avaliação psicológica ocorre em dois momentos.
Primeiramente, o futuro motorista passa por uma entrevista psicológica de 30 min.
Nela, o profissional coleta dados contextuais do candidato, observando possíveis comportamentos que poderão ser reproduzidos na direção.
Em um segundo momento, é aplicado um teste psicológico, com aproximadamente 1h30min. de duração.
Segundo a Resolução 425 do Contran, caso o candidato não seja considerado apto, ele tem, ainda, o direito de pedir a revisão da avaliação psicológica, entrando com recurso na Junta Psicológica do órgão ou entidade que o avaliou.
Essa Junta será composta por 3 profissionais médicos peritos e examinadores de trânsito ou especialistas em medicina de tráfego.
Caso o resultado de inaptidão seja mantido, o candidato ainda pode recorrer ao Conselho Estadual de Trânsito (Cetran) ou ao Conselho de Trânsito do Distrito Federal (Contradife), se residir no DF, em até 30 dias.
O órgão terá 15 dias, a partir do recebimento do requerimento, para designar Junta Médica ou Psicológica para analisar o processo, que também deverá emitir o resultado em até 30 dias.
Nesse tipo de exame, o médico deve analisar se o candidato possui condições de bem-estar para conduzir o veículo.
Serão verificadas, portanto, capacidades visuais, qualidade muscular, coordenação motora, pulso e diferentes focos que o profissional achar necessário.
O examinador também irá analisar o comportamento do candidato quanto ao seu humor, aparência, fala, compreensão, perturbações da percepção e atenção, orientação, memória, concentração, controle de impulsos e indícios do uso de substâncias psicoativas.
Quanto ao aparelho locomotor, o Contran determina que sejam realizados testes para avaliar a integridade funcional de cada membro e coluna vertebral, para que sejam constatadas possíveis malformações, amputações, ausências de movimentos, entre outros aspectos.
Assim como acontece na avaliação psicológica, é também possível solicitar a revisão da avaliação, e os prazos estabelecidos são os mesmos apresentados para a avaliação mental.
Tanto na avaliação física quanto na psicológica, o candidato será enquadrado, conforme o Art.8 da Resolução 425, em:
Apto – quando não houver contraindicação para a condução de veículo automotor na categoria pretendida;
Apto com restrições – quando houver necessidade de registro na CNH de qualquer restrição referente ao condutor ou à adaptação veicular;
Inapto temporário – quando o motivo da reprovação para a condução de veículo automotor na categoria pretendida for passível de tratamento ou correção;
Inapto – quando o motivo da reprovação para a condução de veículo automotora na categoria pretendida for irreversível, não havendo a possibilidade de tratamento ou correção.
Sendo assim, caso o candidato tenha alguma doença que possa representar algum tipo de comprometimento para sua avaliação, deve informar ao órgão avaliador, para que seja enquadrado em outro tipo de avaliação.
Nesses casos, essas avaliações são realizadas tendo como base a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que estabeleceu diretrizes para que candidatos com mobilidade reduzida tenham acessibilidade garantida.
A Norma 14970 da ABNT estabelece que deve ser designada uma Junta Médica Especial para que seja verificada a deficiência física do candidato.
Portadores de deficiência física, ao passarem pelo teste psicológico, também serão avaliados conforme suas condições e limitações.
Como você pode perceber, a legislação compreende que, em alguns casos, o candidato, mesmo sendo diagnosticado com algum tipo de doença, poderá ter seu direito de conquistar a CNH assegurado.
Mas será que existem doenças que impedem alguém de conquistar o documento?
Segundo a Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (ABRAMET), o examinador deve identificar se a doença que o candidato apresenta poderá interferir em seu modo de dirigir o veículo automotor.
A ABRAMET aponta que doenças neurológicas são frequentemente motivos de acidentes de trânsito, pois é preciso que o condutor seja capaz de realizar uma série de movimentos, sem hesitar, independentemente das condições das vias pelas quais for circular.
Portanto, a Associação ressalta que, quando a percepção, o julgamento, a vigilância e a capacidade de realizar as ações necessárias para controlar o veículo não estiverem em bom estado, podem prejudicar a aptidão veicular do condutor, tornando-a insegura.
Doenças neurológicas progressivas representam um alto grau de risco caso os candidatos que as apresentarem não tenham o acompanhamento de especialistas ou não recebam o tratamento necessário.
Abaixo, apresento para você algumas doenças comuns que devem ser analisadas por peritos para ser averiguado se representam algum tipo de risco para o condutor.
Pessoas que sofreram algum tipo de acidente vascular cerebral, que não apresentarem dano neurológico permanente após recuperação completa, poderão retornar a dirigir normalmente.
Caso haja algum tipo de dano motor, sensorial ou neuromuscular, o motorista deverá ser encaminhado à Junta Médica Especial dos Órgãos Executivos de Trânsito, e será avaliado conforme a Norma 14970 da ABNT.
Conforme o resultado da perícia, poderão ser estipuladas restrições ao motorista, havendo a possibilidade da restrição de direção apenas em veículos apropriados.
Pessoas que já sofreram AVC apresentam um risco maior de um segundo episódio.
Portanto, ao retornarem a dirigir, elas devem permanecer sob a supervisão médica, e mesmo em caso de aprovação nos exames de aptidão física e mental, é indicado que o prazo de validade do exame seja menor do que os 5 anos, estipulados pelo Detran, aos demais motoristas.
Ataques isquêmicos transitórios podem causar perda de consciência, confusão mental, arritmias cardíacas, entre outras sequelas que podem atrapalhar o condutor ao dirigir.
Ao sofrer o ataque, é indicado que o motorista espere por volta de seis meses para que sejam diagnosticadas quais foram as causas do ataque e possíveis sequelas.
Assim como no caso do AVC, é indicado que o motorista, mesmo sendo aprovado nos exames, siga acompanhamento médico e tenha o prazo de validade de sua perícia diminuído.
Essa é caracterizada pela medicina como uma doença neurológica progressiva, que pode causar déficits visuais, vertigens e perda sensorial.
Ao passar pelos exames, o motorista deverá ter a força muscular de seus membros verificada, assim como a precisão dos movimentos rápidos dos pés e sua localização espacial.
Uma dificuldade presente nesses casos é que a esclerose múltipla ocorre de forma intermitente e variável e, assim, a pessoa apresenta episódios da doença em pequenos intervalos de tempos.
Portanto, é necessário que o médico continue a acompanhar o caso, pois, inevitavelmente, em algum momento, deverá ser suspensa a CNH desses motoristas.
Pessoas que apresentam esse quadro clinico possuem combinações de déficits de memória e anomalias quanto às funções cognitivas superiores, como, por exemplo, fácil distração e dificuldade para resolver problemas.
Esses déficits poderão representar riscos na hora em que os motoristas estiveram na direção.
Normalmente, esses condutores conseguem dirigir em segurança durante algum tempo, mas eventualmente acabam deixando de dirigir.
Segundo a ABRAMET, estudos recentes afirmam que 76% dos motoristas que apresentam demência leve são capazes de serem aprovados na prova prática de direção veicular.
Entretanto, ressalva que é preciso uma análise do caso por um profissional especializado para que sejam verificadas as condições reais do motorista.
No caso de pessoas com Alzheimer, o paciente e a família devem ser avisados de que, considerando a grande probabilidade de progressão da doença dentro de poucos anos, é preciso que o paciente passe por avaliação a cada 6 meses.
É também recomendado que, mesmo o paciente apresentando um quadro de pouca gravidade, a família e o motorista considerem a possibilidade dele não assumir mais o volante por questão de segurança.
Por conta do acidente recente na praia de Copacabana, estão sendo discutidos e questionados quais seriam as condições necessárias para que o portador de epilepsia assumisse a direção.
Conforme a ABRAMET, o condutor que usa medicamentos antiepiléticos não deve ter seu direito de dirigir negado.
Porém, é preciso que a doença esteja controlada, pois a pessoa que tem crises frequentes acaba sendo submetida a alterações de consciência.
Com isso, tudo vai depender do intervalo de tempo em que ocorrem as crises.
Quanto mais espaçadas, maior a probabilidade de a pessoa dirigir com mais segurança.
Apesar do acidente no RJ, os índices de pessoas que apresentam a doença, de forma controlada, e se envolvem em acidentes de trânsito são muito pequenos.
Mortes ocasionadas por motoristas alcoolizados, ou de morte súbita, são mais frequentes do que de pessoas que sofrem ataques epiléticos na direção.
Ao passar pelo processo de habilitação, é preciso que o motorista portador de epilepsia comprove ser acompanhado por um médico e não ter tido crises no mínimo há 12 meses.
Essas informações devem ser fornecidas pelo médico responsável pelo tratamento, pois quando a pessoa informa, ao Detran, que tem a doença, é aberto um processo em que o médico responsável pelo tratamento do futuro motorista é convidado a responder um questionário.
Nele, será necessário confirmar que o paciente está aderindo ao tratamento, que ingere os remédios e tem dormido de forma regular.
O médico também é questionado sobre o consumo de bebidas alcoólicas, já que é um fator que pode desencadear crises epiléticas.
É recomendado que a pessoa portadora de epilepsia obtenha a permissão de conduzir apenas veículos da categoria B, pois, ao conduzir veículos maiores e mais perigosos, os riscos em caso de acidentes poderão ser maiores.
Deseja saber mais sobre como é o processo de habilitação para portadores da epilepsia no Brasil e no mundo?
Leia mais neste artigo postado no site Psiquiatria Geral.
Desde 2016 tramita, na Câmara Federal, o Projeto de Lei 6200, que solicita, ao motorista que apresentar quadro clínico de doenças causadoras de desmaios, a transparência das informações relativas ao seu estado de saúde.
Se aprovado, os tipos sanguíneos dos motoristas e eventuais doenças que possam causar desmaios passariam a ser informados na CNH do condutor.
Essa proposta ainda está em análise, porém, já é solicitado que o futuro motorista forneça esse tipo de informação ao passar pelo processo da CNH.
Esse questionário deve ser respondido de forma mais verídica possível, sendo considerada crime a omissão de informações.
Conforme o Código Penal, Art. 299, omitir, em documentos públicos, informações particulares com o propósito de ser beneficiado, alterando a verdade, é considerado crime, com pena de reclusão de 1 a 5 anos e multa.
Os benefícios adquiridos ao conquistar a CNH são enormes, e muitas pessoas sonham em ter a permissão para conduzir um veículo.
Entretanto, é importante que você compreenda que a sua segurança e a dos demais motoristas devem estar em primeiro lugar.
Mesmo que você queira ter sua CNH, ao apresentar alguma dessas doenças citadas ou outras, é preciso que você comunique ao Detran para que as medidas cabíveis sejam tomadas.
Como você pode perceber, apesar de alguns impedimentos, é possível que o condutor, ao apresentar algum desses quadros, ainda possa usufruir deste sonho.
Para isso, basta que não sejam omitidas as devidas informações.
Depois de fazer a leitura do artigo, restou alguma dúvida? Entre em contato!
Nós do Doutor Multas estamos sempre dispostos a diminuir a distância entre você e a legislação vigente quando o assunto é o trânsito e suas especificidades.
Deixe sua opinião aqui nos comentários!
Fonte consultada: Abramet
Referências:
Aproveite para compartilhar clicando no botão acima!
Esta página foi gerada pelo plugin
Visite nosso site e veja todos os outros artigos disponíveis!